Nome oficial |
República de Panamá |
Localização |
América Central. Banhado pelo mar do Caribe e pelo oceano Pacífico. Faz fronteira com a Costa Rica e ao sul com a Colômbia |
Estado e Governo¹ |
República presidencialista |
Idiomas¹ |
Espanhol (oficial) e línguas indígenas locais |
Moeda¹ |
Balboa |
Capital¹ |
Cidade do Panamá |
Superfície¹ |
75.420 km² |
População² |
3.678.128 hab. (2010) |
Densidade demográfica² |
49 hab./km² (2010) |
Distribuição da população³ |
Urbana (67,12%) e |
Analfabetismo⁴ |
5% (2015) |
Composição étnica¹ |
Mestiços de ameríndios e brancos (65%), ameríndios (12,3%), negros ou afrodescendentes (9,2%), mulatos (6,8%), brancos (6,7%) (2010) |
Religiões¹ |
Católica romana(85%), protestantes (15%) |
PIB (a preços constantes de 2010)⁴ |
US$ 38,127 bilhões (2013) |
PIB per capita (a preços constantes de 2010)⁴ |
US$ 9.866,4 (2013) |
Dívida externa pública⁴ |
US$ 12,23 bilhões (2013) |
IDH⁵ |
0,765 (2013) |
IDH no mundo |
65° e 9° |
Eleições¹ |
Presidente eleito por sufrágio universal a cada 5 anos. Legislativo unicameral composto da Assembleia Nacional com 71 membros, eleita por sufrágio universal a cada 5 anos. O ministério é nomeado pelopPresidente. |
Fontes:
¹ CIA. World Factbook
² ONU. World Population Prospects: The 2012 Revision Database
³ ONU. World Urbanization Prospects, the 2014 Revision
⁴ CEPALSTAT
⁵ ONU/PNUD. Human Development Report, 2014
O século XX panamenho caracterizou-se pelo nascimento de um movimento popular que periodicamente revolvia as bases da estrutura social e de suas instituições políticas. Os movimentos populares respondiam qualitativamente aos diferentes momentos, próprios do desenvolvimento capitalista da época.
Além disso, distinguiu-se pela luta que o projeto nacional enfrentou contra o neocolonialismo norte-americano. Os Estados Unidos, aproveitando-se do Tratado do Canal, firmado em 1903, apropriaram-se de uma área ao redor da via aquática (Zona do Canal do Panamá), convertendo-a em um território com jurisdição subordinada a eles, até 1977, e ocupando-a militarmente, até 1999. Os enfrentamentos diplomáticos e políticos da época culminaram, em 1964, com uma insurreição popular que modificou a relação entre os dois países.
Esse período também foi caracterizado pela aparição de uma classe média ascendente, possuidora de altos níveis educacionais, com serviços de saúde, desenvolvimento urbano e gosto pelo consumismo. Nesse período, a classe média conseguiu criar partidos que irromperam com relativo êxito nas lutas pelo poder.
Apesar dos avanços assinalados no campo das lutas sociais, nacionais e políticas, o Panamá não conseguiu institucionalizar uma ordem que o estabilizasse. No início do século XXI, os trabalhadores e suas organizações tenderam a retroceder, tanto qualitativa como quantitativamente. A evacuação das bases militares norte-americanas e a entrega do Canal do Panamá ao governo nacional, acordadas em 31 de dezembro de 1999, ainda não impulsionaram os resultados esperados. Além disso, a classe média perdeu a capacidade política para dirigir os destinos do país.
O Panamá não conseguiu enfrentar com uma política alternativa a ofensiva dos países capitalistas mais avançados, que descarregaram sobre a periferia do sistema capitalista os custos da reordenação econômica. A chamada globalização, que pretende desarticular os mercados nacionais formados no século XX, e o neoliberalismo, que serve de bandeira ideológica desse movimento, fizeram incursões importantes no Panamá. Apesar de contar com algumas vantagens relativas – a posição geográfica (Canal do Panamá, Zona Franca regional e outros serviços), a formação social da população – os últimos governos em exercício cederam ante as instituições financeiras internacionais aplicando políticas de desregulamentação, flexibilização e privatização.
A classe transitista
Para entender esse processo, que caracteriza o início do século XXI, é necessário situá-lo no contexto próprio do desenvolvimento do capitalismo mundial e na inserção do Panamá em suas contradições. No entanto, essa análise, por si só, seria inútil e incompleta para descrever e explicar a realidade panamenha. Por essa razão, é necessário examinar as relações sociais que caracterizam o Panamá e a forma em que se foram configurando ao longo da história.
Diferentemente de outros países da região latino-americana, o Panamá não contou com uma oligarquia fundiária ansiosa por aproveitar a demanda de sua produção agrícola em troca de produtos industriais que caracterizaram a região durante parte do século XIX e princípios do século XX. No caso do Panamá, a posição geográfica e o movimento financeiro deram lugar a uma classe social dedicada à prestação de serviços (comerciais, financeiros e de transporte) que foi estabelecida durante a colônia espanhola (séculos XVI ao XIX) e que conseguiu sobreviver ao período de união com a Colômbia já independente, que durou de 1821 até 1903, e ao século XX (republicano). Essa classe, identificada como transitista, não tem vínculo com a produção material de riquezas nem com a posse territorial. Sua vocação está ligada ao financiamento da circulação de mercadorias.
Do mesmo modo que a burguesia produtiva (industrial ou agrícola), a fração capitalista transitista, dedicada à prestação de serviços, esmera-se em fazer crescer seu lucro. Também está submetida às exigências da competição capitalista, que se manifesta com a transformação constante das forças produtivas. No caso do Panamá, isso se traduz na história da rota de trânsito inicialmente servida por burros de carga sobre o Caminho Real, depois substituída por uma ferrovia transoceânica e, finalmente, pelo Canal de eclusas. Além disso, similarmente à burguesia, para sobreviver e reproduzir-se, essa parcela transitista deve influenciar o governo em exercício (se possível) ou controlar suas políticas.
A análise dos processos sociais que permanecem no nível das forças produtivas, entretanto, não consegue captar a totalidade dos movimentos que caracterizam uma sociedade. As relações sociais são produzidas e se reproduzem tanto nos centros de produção material como no cotidiano ideológico. Em outros países latino-americanos, as oligarquias latifundiárias conseguiam exercer hegemonia sobre os outros grupos sociais e no caso do Panamá, a hegemonia é exercida pela classe que presta serviços na rota do transporte, nesse caso particular, a fração da classe transitista. Ou seja, a classe que domina a rota de trânsito subordinando as políticas produtivas e comerciais, bem como os grupos associados a essas atividades, exerce sua hegemonia, fazendo com que suas ideias sejam aceitas como próprias pelo conjunto dos grupos sociais.
No entanto, diferentemente da classe proprietária de terras, que perdeu a hegemonia com as crises do início e de meados do século XX na América Latina, a classe transitista foi questionada severamente em meados do século XX. Mas tudo indica que no início do século XXI conseguiu recuperar a hegemonia perdida.
Um exame da realidade panamenha, com ênfase nos desafios do século XXI, deve passar pela relação social entre a fração da classe transitista e os movimentos populares. Para isso, analisa-se a seguir a hegemonia dessa classe e seus enfrentamentos com os grupos sociais que reataram sua ideologia, especialmente os que erigiram projetos de nação no último século.
Rota de trânsito e projeto de nação
Muitos historiadores panamenhos assinalam que para entender o Panamá é preciso ler a Declaração de Independência, de 28 de novembro de 1821. O documento reúne o sentimento dos criollos (filhos dos imigrantes), que, como no resto da América, decidiram romper os laços coloniais com a metrópole espanhola. No caso do Panamá, talvez porque a decisão tenha sido tomada de forma tardia, efetuou-se com maior maturidade.
A Declaração apresenta ambiguidades em dois sentidos. Por um lado, propõe a necessidade de associar-se com o projeto colombiano lançado por Simón Bolívar que os chamava à unidade regional. Por outro, resgata seu interesse de conservar a autonomia econômica, consciente de sua posição estratégica como ponte entre os oceanos Pacífico e Atlântico.
Essa contradição constitui o fio condutor dos processos sociais do istmo desde a fundação da cidade de Nuestra Señora de la Asunción de Panamá (1519) até os dias atuais, ou seja, quase meio milênio. O historiador panamenho Castillero Calvo apresenta rica documentação sobre os enfrentamentos entre os interesses pizarristas e os transitistas em meados do século XVI. Calvo refere-se à produção agropecuária representada pelos espanhóis, que haviam participado do início da conquista da América (1492-1550). Contavam com privilégios como capitulações e mayorazgos, associados a formas de exploração de latifúndios e escravos. Em meados do século XVI, os especuladores que prestavam serviços ao trânsito pela rota do Panamá começaram a deslocar os produtores dos círculos do poder. Esse choque gerou fortes enfrentamentos.
Atualmente, as mesmas frações continuam lutando pelo poder. Naquela época, os transitistas conseguiram impor-se, entre outras razões, graças ao poder da Coroa espanhola. No início do século XXI, tudo indica que a balança do poder se inclina a seu favor, graças ao apoio dos Estados Unidos.
Por interesses transitistas entenda-se aqueles que se identificam com o mercado capitalista mundial e o consideram apropriado. É uma fração de classe cuja base de poder não descansa sobre a produção de riquezas (ou valores), não aspira converter-se em latifundiária, tampouco comanda força de trabalho e não lhe interessa contar com uma burocracia (civil ou militar). Seu interesse é servir de mediadora das mercadorias e valores financeiros que são obrigados a transitar pela rota do istmo do Panamá. Seu monopólio sobre a rota permite-lhe negociar favoravelmente com produtores, comerciantes e, até, representantes dos Estados que aspiram acelerar a realização de suas mercadorias.
A colônia espanhola
Durante a colonização espanhola, a fração transitista panamenha sentia-se relativamente cômoda sob a proteção da Coroa. Madri mobilizava sua capacidade militar financiada por um incipiente, e ainda inseguro, capitalismo europeu.
A biografia moderna do capital começou no século XVI, com o comércio e o mercado mundiais. O comércio dominante durante três séculos foi o que se iniciou com as exportações minerais da Bacia do Pacífico da América até a Europa, complementada por mercadorias elaboradas na direção contrária. O período sob a bandeira colombiana (1821-1903) pode ser considerado um interregno entre o colapso da Espanha e a consolidação parcial dos Estados Unidos.
A Espanha necessitava da rota do istmo para sua política de extração mineral na América do Sul, iniciada no século XVI e esgotada no século XVIII. Já os Estados Unidos precisavam desse curso para completar sua conquista territorial do continente norte-americano e converter-se em potência mundial, econômica e militar, capaz de dominar dois oceanos. Os norte-americanos conseguiram seu objetivo no início do século XX, menos de meio século depois da inauguração do Canal do Panamá. No fim desse mesmo século, o Canal do Panamá (consequentemente, a rota do istmo) já não tinha mais importância estratégica para Washington.
O século colombiano
O colapso do projeto colombiano de Bolívar, em 1831, pôs fim ao sonho de converter a rota do Panamá no estreito de Corinto do mundo moderno. Durante o século XIX, a classe transitista sobreviveu graças à construção da ferrovia transístmica (a serviço do desenvolvimento da Califórnia, recém-anexada à união norte-americana) e ao projeto fracassado do Canal francês, empreendido pelo engenheiro Ferdinand De Lesseps (1880).
O século colombiano (1821-1903) chegou ao fim de maneira precipitada. A Guerra dos Mil Dias, em que conservadores e liberais se enfrentaram entre 1899 e 1903, arruinou o país e deixou a fração transitista ante um dilema que só pôde ser resolvido traindo seus protetores em Bogotá. Como assinalaria o cientista social panamenho Hernán Porras, vendo-se perdida na voragem que significava continuar no contexto de um desenvolvimento nacional, a fração transitista negociou a independência do istmo diretamente com os Estados Unidos. O elevado preço que pagou pela aventura ianque foi entendido quase imediatamente por seus autores.
Ainda que a fração transitista, que apareceu no Panamá em meados do século XVI, nunca tenha realizado um projeto nacional (desenvolvimento territorial da área sobre a qual exercia alguma forma de soberania parcial ou total) outros grupos sociais o fizeram. No século XVI, os pizarristas enfrentaram os transitistas e foram derrotados quando estes receberam o apoio da Coroa. Durante o período colonial espanhol, os intentos de dar alguma organicidade aos interesses terratenentes foram anulados também pela metrópole.
Durante o século colombiano, Bogotá converteu o Departamento do Panamá em um enclave para alimentar os cofres do governo central. As sublevações periódicas que exigiam mais autonomia eram derrotadas por tropas colombianas interessadas em conservar as fontes de divisas para Bogotá.
O movimento separatista de 1903
De maneira conflitante, a correlação de forças mudou, a partir de 1903, com a intervenção militar norte-americana, que reconheceu a nova República. Ao mesmo tempo, entretanto, a presença dos EUA no istmo pôs obstáculos à função histórica da fração transitista e complicou o surgimento de uma nova aliança classista que pretendia construir o mercado nacional. É preciso ter em conta que a fração transitista não tinha vocação para administrar e menos ainda para governar. Durante a colonização, deixou esse papel para a burocracia a serviço da Coroa. No século XIX, os governadores eram enviados de Bogotá. A partir de 1903, os transitistas tiveram de recorrer aos próprios recursos humanos, com o apoio de débeis frações dos partidos conservador e liberal. Para resolver o problema administrativo, recorreu a caudilhos políticos com capacidade para agrupar os distintos setores do país.
Enquanto os Estados Unidos se dedicaram a construir o Canal e a operá-lo em razão de seus interesses nacionais, no Panamá desatou-se uma luta pela hegemonia e pelo poder político. A luta pela hegemonia polarizou-se sobre dois eixos. Por um lado, o projeto transitista, sintetizado no logotipo do escudo que apareceu depois da independência: pro mundo beneficio (para o benefício do mundo). Por outro, o projeto nacional, sintetizado na luta pela soberania e definido pela criação de um mercado nacional.
A questão social e o golpe militar
O projeto transitista levava o selo de vários séculos. Já o projeto para constituir o mercado nacional só adquiriu vigor em meados do século XX e representou um desafio à hegemonia da fração transitista. Encabeçado por uma burguesia que pretendia consolidar o mercado, o projeto nacional encontrou aliados estratégicos na classe operária, nos produtores agrícolas e em uma classe média ascendente. Além disso, setores vinculados aos serviços e ao comércio somaram-se a esses grupos com uma tática para alcançar benefícios conjunturais.
O rápido crescimento do mercado nacional, traduzido em taxas médias de Produto Interno Bruto (PIB) anuais de 8%, entre 1953 e 1967, submeteu a fração transitista a uma profunda redefinição. A perda parcial de sua hegemonia gerou uma crise de Estado que se arrastou por quase duas décadas sem solução, provocando o golpe militar de 1968.
O colapso do regime liberal-transitista, em meados do século XX, explica-se pela crescente debilidade da fração transitista e sua insistência em manter o controle sobre as decisões políticas do país. As contradições internas eram ventiladas pelas demandas internacionais, que exigiam políticas de desenvolvimento econômico e, ao mesmo tempo, controle sobre os movimentos sociais alternativos, simpatizantes ou não do bloco socialista.
O governo militar instaurado em 1968 tinha como objetivo resolver a crise e estabilizar a situação. Depois de um período de incerteza, sob a liderança de Omar Torrijos, os militares optaram por apoiar o projeto de desenvolvimento nacional. O discurso abandonou o projeto transitista e inclinou-se a favor de uma opção desenvolvimentista, que implicava consolidar o mercado nacional. Nessa estratégia, destacam-se dois elementos centrais: a nacionalização da questão do Canal serviu de eixo para definir uma política de unidade (“por cima das classes sociais”); o reconhecimento da questão operária serviu de eixo para resolver a crise de hegemonia provocada pela debilidade da fração transitista.
O acentuado endividamento da década de 1970 permitiu aos militares o investimento em programas sociais e econômicos, que incorporaram politicamente a maioria dos panamenhos ao projeto nacional. Contudo, a descapitalização da década de 1980 e as mudanças internacionais provocaram o colapso do regime militar e a aparição da agenda do programa neoliberal.
Nesse quadro, serão examinados quatro atores sociais:
• a fração transitista;
• a burguesia nacional, que é uma fusão da velha classe de produtores agrários e industriais, surgidos no calor das políticas de substituição de importações;
• a classe operária, fruto das obras transitistas e da indústria nacional, que emergiu em meados do século XX;
• a classe média ascendente, produto das atividades do Canal do Panamá e da posterior aparição do mercado nacional.
Nesse exame, evidenciam-se como seus interesses se articulam, entram em contradição e se projetam para o futuro. Para tanto, devem ser analisados seus projetos, suas alianças (internas e externas) e suas organizações políticas.
O exame dos longos processos de acumulação capitalista mundial não deixa dúvidas sobre a estreita integração do istmo ao sistema global. Mesmo quando a análise privilegiar os processos internos, com todas as suas contradições, não se diminuirá a importância que tem para a formação social panamenha o fato de fazer parte de um eixo central do processo de acumulação capitalista global: a rota do istmo.
A fração transitista
A classe capitalista é aquela que move recursos, materializa créditos, mobiliza mercadorias, adquire força de trabalho e financia a criação de infraestrutura. O capitalista só trabalha com dinheiro. Já o empresário trabalha com o dinheiro do capitalista para fazer a força de trabalho produtiva quando esta se combina com a tecnologia. A competência consiste em determinar quando o investimento é mais produtivo.
O empresário, entretanto, precisa considerar múltiplos fatores quando decide como vai organizar seus recursos. Tem de estudar a distância, os obstáculos existentes entre o produto de seu investimento e os consumidores, e também conhecer o comportamento e os projetos da concorrência para determinar as vantagens e definir suas estratégias.
O istmo do Panamá, desde data remota (primeira metade do século XVI), foi convertido pela Coroa espanhola em uma entidade sob seu controle político direto para transportar as riquezas minerais do Peru à metrópole. Sob a proteção da Coroa, capitalistas estabeleceram-se nas cidades terminais do istmo com a única incumbência de financiar a aquisição de meios de transporte marítimo, fluvial ou terrestre. Emprestavam recursos para armazenar e assegurar mercadorias nos portos e para oferecer alojamento, alimentação e entretenimento. Os empresários, por sua vez, traziam de cada recanto do império espanhol as mercadorias solicitadas: madeira para barcos, vestimenta para marinheiros, alimentos para viajantes e escravos para realizar o trabalho manual e artesanal.
Entre 1550 e 1650, as feiras do istmo sustentavam essa estrutura social baseada no transitismo. Espanhóis, criollos e escravos formavam as classes sociais, presentes no marco de uma sociedade estritamente hierarquizada. Com o declínio das feiras, a partir de meados do século XVII, a Espanha buscou fórmulas para sustentar sua privilegiada posição geográfica no istmo (levando em conta a perda da Jamaica e do Haiti para seus inimigos europeus).
A partir de 1663, a Coroa estabeleceu o situado, que representava “um subsídio em dinheiro que, por ordens da Coroa, a Caixa de Lima devia transferir ao Panamá a cada ano para cobrir os gastos militares”. Com o situado, o Panamá beneficiou-se do comércio inter-regional, que tratou dos escravos e do contrabando pelos cem anos seguintes.
O que foram as feiras até meados do século XVII foram o situado e outras atividades complementares até o fim do século XVIII. Ou seja, durante quase três séculos, os capitalistas transitistas não tiveram rivais significativos no istmo do Panamá e puderam contar com a generosa proteção da Coroa espanhola.
No fim do século XVIII e começo do século XIX, o império espanhol já não se sustentava. As colônias mais atrasadas se rebelaram (Venezuela, Chile e Buenos Aires), e, rapidamente, outras seguiram pelo mesmo caminho. O Panamá esteve entre as últimas colônias do continente a se desgarrar, devido à prosperidade momentânea advinda com as guerras napoleônicas na Europa e as insurreições na América.
A classe transitista negociou as mudanças que tinha de realizar com as potências europeias e também com as novas repúblicas americanas. A Grã-Bretanha propôs um complexo sistema de alianças ao estilo hanseático para conservar sua autonomia relativa e, ao mesmo tempo, garantir sua proteção militar. Foram enviados emissários ao Peru e ao México a fim de explorar possíveis acordos políticos. Finalmente, os panamenhos, encabeçados pela classe transitista, expressaram sua vontade unindo-se à Grã-Colômbia, criação recente das forças libertadoras de Bolívar.
Durante trezentos anos, o discurso transitista foi hegemônico no istmo. Apesar dos problemas, dos momentos difíceis quando desapareceram as feiras, quando diminuiu o situado ou declinou o comércio, a resposta dos capitalistas transitistas sempre foi a de manter as esperanças em um novo investimento que fizesse a rota mais competitiva. Quando quase se perdia a última esperança, durante a primeira metade do século XIX, o capitalismo mundial deu um novo giro introduzindo a indústria moderna como eixo central de seu desenvolvimento. A demanda de novas matérias-primas e de rotas rápidas para transportar mercadorias converteu o Panamá, novamente, em um elo-chave no processo de acumulação capitalista.
A partir de meados do século XIX, a rota do Panamá foi se convertendo cada vez mais na união dos oceanos para o ascendente império norte-americano. Nos últimos 150 anos (1856-2006), a hegemonia da classe transitista no istmo dependeu, em grande parte, de seus interesses coincidentes com a potência norte-americana. Tal qual a Coroa espanhola, os Estados Unidos viram na rota de trânsito um ponto-chave em sua expansão comercial e, ao mesmo tempo, uma base para lançar suas expedições militares.
A burguesia nacional
A aparição de um mercado interno, produto das políticas de substituição de importações em meados do século XX, favoreceu o surgimento da burguesia nacional panamenha. Tratava-se de uma classe relativamente débil, levando em conta a extensão do mercado interno do Panamá. Contudo, tinha a seu favor dois fatores: a conquista paulatina do enorme potencial aquisitivo resultante da presença neocolonial norte-americana (que incluía uma poderosa máquina militar) no istmo; um setor agrícola ansioso por encontrar um mercado para seus produtos. Além disso, dispunha de uma classe trabalhadora experimentada, à qual se juntava uma nova classe operária de origem camponesa, que crescia rapidamente e buscava emprego.
No calor das políticas nacionalistas que promoviam investimentos produtivos, vias de comunicação internas, gastos no setor social (saúde, educação, moradia etc.), a burguesia nacional desafiou a hegemonia da classe transitista. Conseguiu apoderar-se do centenário Partido Liberal, formar alianças táticas com os grupos do setor agrário e, até, com os partidos de bandeira proletária.
De 1956 (eleição de Ernesto de la Guardia à presidência da República) até 1981 (morte de Omar Torrijos), o projeto nacional da burguesia avançou superando obstáculos e crises. Colocou na agenda a consolidação do mercado nacional, mediante um conjunto de reformas (tributária, educativa, urbana e agrária), assim como a incorporação da Zona do Canal (neocolônia norte-americana, de 1.000 km², situada ao redor da via aquática). Nesse período de apenas 25 anos, o PIB multiplicou-se vinte vezes, e a classe operária e a população estudantil cresceram dez vezes. O mais sério desafio conservador transitista a esse processo produziu-se no fim da década de 1960. Foi um período de instabilidade política, resolvido por meio do golpe militar de 1968, que permitiu a aceleração da agenda nacional. As reformas iniciadas pelos liberais na década de 1950 foram continuadas pelos militares na década de 1970.
Como resultado dessas transformações, o Panamá chegou ao último período do século XX com uma estrutura social “modernizada”, a economia nacionalizada e a soberania política consolidada (os tratados do Canal de 1977). Em termos ideológicos, no entanto, a classe transitista ainda conservava recursos suficientes para não perder toda sua hegemonia.
Essa força foi essencial ao Panamá para enfrentar o projeto nacional no fim da década de 1980. Mediante uma aliança com os Estados Unidos, em dezembro de 1989, realizou-se a invasão militar, lançada por Washington, para derrotar os nacionalistas remanescentes no poder. O governo norte-americano justificou sua invasão militar aduzindo que pretendia prender o chefe das Forças de Defesa do Panamá, o general Manuel Antonio Noriega, que foi acusado de narcotraficante e condenado a quarenta anos de prisão nos EUA. A partir da derrota, a agenda nacional, encetada na década de 1950, foi abandonada, iniciando-se um período em que prevaleceram as políticas neoliberais, que se estende até os dias de hoje.
Como consequência imediata, a burguesia nacional optou por abandonar suas alianças táticas com o setor agrário e o proletariado. Os governos que se seguiram à invasão, dominados por dirigentes comprometidos com o discurso transitista e neoliberal, desmontaram a estrutura econômica mediante políticas de privatização, reestruturação e flexibilização.
O Partido Revolucionário Democrático (PRD), criado em 1978, para levantar a bandeira da burguesia nacional, em busca da liderança, alterou radicalmente seu plano de trabalho depois da invasão norte-americana e realinhou-se com a classe transitista, hegemônica e conservadora. Sobre uma plataforma que respondia a uma agenda neoliberal, o PRD recuperou o poder político perdido nas eleições de 1994. Entretanto, a burguesia nacional não voltou a levantar-se com o triunfo eleitoral do PRD. Seu projeto nacional não se recuperou e sua luta pela hegemonia fraturou-se.
O exposto não implica que o projeto nacional tenha desaparecido do istmo. Novas circunstâncias podem gerar, no futuro, condições diferentes. O fato de o projeto nacional do século XX ter sido hegemonizado por uma burguesia associada às políticas de substituição de importações não significa que o futuro tenha de ser considerado nesses termos.
Desde o século XVI, o Panamá tem sido testemunha de projetos que, por seus objetivos, podem ser considerados “nacionais”. O historiador Castillero Calvo revelou os pizarristas que enfrentaram os transitistas por ocupar espaços na estrutura do poder. De igual modo, segundo o autor, no século XVII apareceram seguidores das teorias que pretendiam desenvolver a lavoura panamenha. A Guerra dos Mil Dias (1899-1903), segundo Hernán Porras, marcou outro episódio, quando a classe transitista perdeu momentaneamente sua hegemonia ante uma aliança de classes nacionais.
A classe operária
Diferentemente do que se observa em outras camadas sociais panamenhas, sobre a classe operária do istmo escreveu-se muito. Para alguns, ela surgiu com a construção da ferrovia entre 1850 e 1855. Para outros, os sinais precisos de seu aparecimento vieram com a construção do Canal do Panamá (1904-1914). Há quem a aponte como produto do projeto de industrialização, sobre a base da substituição de importações, de meados do século XX.
Para as primeiras duas teses, seus promotores alegam que o aspecto quantitativo transformou a estrutura social panamenha. Os empresários da ferrovia, em meados do século XIX, importaram milhares de trabalhadores da Europa, América e Ásia. As organizações de trabalhadores foram efêmeras ainda que suas lutas reivindicativas tivessem êxitos pontuais. Por sua vez, o governo norte-americano, que converteu a construção do Canal, no princípio do século XX, em uma empresa militar, levou às praias do istmo mais de 100 mil trabalhadores, em sua maioria do Caribe anglo e francófono. Esses trabalhadores antilhanos foram submetidos a um regime férreo, com matizes racistas, diferente do sistema utilizado com operários norte-americanos e europeus. Suas organizações de classe chegaram impregnadas de ideologias europeias. Os antilhanos formaram logias, na tradição das trade unions inglesas. Os espanhóis levaram suas organizações anarquistas. E os trabalhadores norte-americanos montaram suas organizações trabalhistas.
Os enfrentamentos com as autoridades norte-americanas foram violentos durante a construção do Canal. Nos dez anos, produziram-se mais de cem greves e paralisações, e os Estados Unidos reagiram com repressão e destruição maciças. Terminada a construção, as organizações consolidaram-se, aparecendo grupos socialistas e comunistas. A Federação Sindical do Panamá foi a primeira organização que respondeu a interesses mais amplos, incorporando ao seu programa a necessidade de apoiar as lutas sociais. Destacou-se na grande greve do inquilinato, de 1925.
A partir desse ano, os trabalhadores incorporaram a questão social em sua agenda estreitamente ligada à questão nacional. A greve do inquilinato teve um saldo de oito mortos, produto da intervenção militar dos Estados Unidos, solicitada pelo governo panamenho. Os trabalhadores tiveram plena consciência de que a solução para seus problemas não seria encontrada em uma instância estranha.
Durante vinte anos (1925-1945), eles continuaram sendo reprimidos, com uma trégua parcial durante a Segunda Guerra Mundial. A influência dos Partidos Comunista e Socialista cresceu de forma significativa, introduzindo uma visão ideológica alternativa à crescente classe trabalhadora e aos setores populares.
As organizações populares e sindicais começaram a promover uma linguagem socialista com conteúdos desenvolvimentistas e de progresso, com ênfase na industrialização, na modernização da lavoura e no aumento do bem-estar. Nesse último sentido, o discurso coincidia em parte com os pronunciamentos da burguesia nacional da época.
A aliança populista entre a burguesia nacional e a classe operária organizada começou a se forjar durante a Segunda Guerra Mundial. Contudo, a política exterior anticomunista dos EUA impôs obstáculos à sua realização. Tardiamente, se comparado ao que ocorreu no resto da América Latina, a aliança só conseguiu se afirmar no princípio da década de 1970, quando o regime militar liderado por Omar Torrijos iniciou o cerco à classe operária.
Outra diferença da classe operária panamenha em relação às suas irmãs latino-americanas está em não ter conseguido constituir um movimento centralizado. A Federação Americana do Trabalho e Congresso das Organizações Industriais (AFL-CIO) manteve sua influência no movimento operário panamenho, controlando uma de suas maiores centrais, criada no início da década de 1960. Outra central, fundada em meados da década de 1950, era controlada por uma corrente pró-soviética. Também o Movimento Social Cristão Internacional possuía uma central operária, criada em meados da década de 1960, que exercia influência sobre os trabalhadores do país. No início da década de 1970, surgiu uma quarta central independente, de ideologia socialista.
Torrijos conseguiu juntar as diferentes centrais operárias em um Conselho Nacional de Trabalhadores Organizados (Conato), depois de aprovar o Código do Trabalho, em 1972. A nova legislação proporcionou poder participativo aos sindicatos, mediante o uso obrigatório de documentação timbrada, de cotas trabalhistas, da proibição da demissão injustificada e da organização de comissões no novo Ministério do Trabalho da época.
A partir da década de 1980, os programas de ajuste estrutural introduzidos pelos governos em exercício tenderam a debilitar o movimento dos trabalhadores e a subtrair suas conquistas. O número de trabalhadores organizados se estancou na década de 1980 e se reduziu em termos absolutos na década seguinte. Nos primeiros anos do século atual, a massa empregada diminuiu pela primeira vez na história do país.
Na década de 1990, a reforma do Código do Trabalho tirou da classe operária o direito à organização sindical. A política de flexibilização e as privatizações geraram uma crise generalizada nas organizações trabalhistas, de difícil recuperação. O sindicato dos operários da construção, Suntracs, foi o único que conseguiu manter-se ativo, apesar das políticas neoliberais e da perseguição a seus dirigentes. Além disso, devido ao crescimento prolongado do setor de construção no Panamá, o número de trabalhadores organizados aumentou moderadamente no início do século XXI.
A classe média
Como diria Marx, a classe média assume um papel importante na definição do desenvolvimento de um país. Pode inclinar-se por uma solução revolucionária ou reacionária. No Panamá, a classe média flutuou de um lado para o outro. Definiu os processos políticos, na medida em que as soluções às suas aspirações foram resolvidas. Irrompeu no país durante a primeira metade do século XX, com o surgimento de uma classe de pequenos industriais, artesãos e profissionais que exigiam participar dos processos políticos. Em meados do século XX, porém, questionou a estrutura política vigente e, aliada aos setores populares, debilitou a estabilidade institucional.
A classe média panamenha viu-se atraída pelas propostas populares enquanto estas lhe permitiam questionar as práticas políticas dos setores dominantes. Ao mesmo tempo, no entanto, tinha afinidades com a burguesia nacional e o projeto de constituir um mercado. As promessas da fração transitista também seduziram essa camada social. Foram os pequenos produtores e profissionais que se converteram na balança do poder nos momentos conjunturais-chave da história do século XX panamenho.
A classe média moveu-se ideologicamente de um lado a outro: ora inclinou-se pelas promessas socialistas da revolução, ora apresentou-se como força social conservadora para enfrentar uma burguesia nacional corrupta. Começou a última metade do século XX comprometida com a questão social e o projeto nacional. Ao encerrar o século, no entanto, somou-se à chamada Cruzada Civilista, que liquidou o projeto nacional construído ao longo do século XX.
Apesar de se perfilar como grupo social com capacidade para dirigir os destinos do país, a classe média careceu de um projeto próprio. Na década de 1920, representantes de pequenos empresários, profissionais e jovens formaram o Movimento de Ação Comunal, que, segundo o historiador e educador Ricaurte Soler, foi cooptado pelos partidos políticos tradicionais, vinculados ao liberalismo na década de 1930.
Na década de 1940, reapareceu um movimento das camadas médias, revitalizado com a participação de educadores e novos profissionais, produto das políticas de desenvolvimento. Diferentemente da Ação Comunal da década de 1920, a nova Frente Patriótica da Juventude inclinou-se mais para as posições esboçadas pelos setores populares e sindicais. Contudo, como seu antecessor de duas décadas antes, a Frente foi cooptada pelo dirigismo tradicional e incorporada às alianças eleitorais, assim como os governos em exercício da década de 1950. Setores da classe média reagiram a essa claudicação, organizando movimentos armados, que se estenderam ao longo dos anos 1950 até o começo dos anos 1970.
Na década de 1960, a classe média parecia encontrar-se em condições de dirigir o país para a consolidação e o pleno desenvolvimento do projeto nacional. O crescimento industrial, a expansão do mercado nacional e a radicalização da juventude criaram as condições necessárias para agregá-la e produzir um novo tipo de liderança política. A insurgência de 9 de janeiro de 1964, em protesto pela presença militar norte-americana no país, abriu o panorama para que as camadas médias assumissem um papel na condução política do conjunto de forças sociais. Entretanto, motivadas pelas eleições presidenciais desse mesmo ano (maio de 1964), as organizações da classe média foram incapazes de mobilizar-se. Por consequência, os partidos políticos tradicionais continuaram circundando o espaço eleitoral e disputando o triunfo nas urnas. A desorganização da classe média e a divisão da classe operária, somadas às ações inconsistentes da classe política tradicional, culminaram com a crise de condução de 1968 e o golpe militar de 11 de outubro.
Foram os militares na década de 1970 que assumiram as tarefas da burguesia nacional e da classe média, ao executar as reformas liberais, questionar a hegemonia da fração transitista e subscrever com os EUA o Tratado Torrijos-Carter, que pôs fim à presença desse país no istmo a partir de 1999. Os militares – legitimando, em parte, seu governo de fato – mobilizaram as camadas médias para ocupar os cargos de direção política nos ministérios, nas entidades públicas e na política exterior. Além disso, reforçaram sua legitimidade convocando trabalhadores organizados a participar na estruturação do “novo Panamá”.
A rápida mobilização dos setores populares excedeu a das classes médias, que não tiveram a capacidade de institucionalizar os avanços alcançados. A Guarda Nacional, instituição militar criada em 1953 e substituída em 1983 pelas Forças de Defesa do Panamá, sob a orientação dos EUA, consolidou-se na década de 1970 com a liderança do general Torrijos. Os diferentes setores sociais não só concederam à instituição militar a direção do governo nacional, como também colocaram a liderança mediadora de Torrijos acima de seus interesses particulares. O desaparecimento físico de Omar Torrijos, comandante da Guarda Nacional, em 1981, produziu um reagrupamento que acelerou tanto a reincorporação dos partidos políticos tradicionais como a recuperação da ideologia transitista e os ajustes estruturais da economia (neoliberalismo).
A crise da superprodução
Em 1984, Nicolás Ardito Barletta foi eleito à presidência da República. Sua vitória era sintomática dos eventos que se aproximavam. Ardito Barletta renunciou à vice-presidência do Banco Mundial para lançar sua candidatura. As mudanças introduzidas pelo novo governo anunciavam a crise do modelo “populista” militar e o enfrentamento entre o Panamá e os EUA, que levaria estes a invadir militarmente o istmo em 1989. A invasão marcou a recuperação da hegemonia perdida por parte da fração transitista, deteve a marcha do projeto nacional e desarticulou as organizações das camadas médias e dos trabalhadores.
Em escala internacional, a crise de “superprodução” interrompeu o fluxo de créditos fáceis que caracterizou a década anterior. A “superprodução” conduziu à política de abertura – mediante tratados, pressões e até pela força – dos mercados dos países periféricos às exportações do centro. No interior do Panamá, tentou-se reduzir o papel do Estado de produtor ao de facilitador. Os ajustes da década de 1980 reduziram a capacidade produtiva do país. A eliminação das tarifas alfandegárias nos anos 1990 abriu o mercado interno à produção mundial, especialmente dos EUA. O desemprego aumentou e o setor informal expandiu-se para dar acolhida a uma massa crescente de trabalhadores. A renda de um percentual importante das camadas médias caiu abaixo da linha de pobreza e setores da classe operária viram-se lançados à pobreza extrema.
Paradoxalmente, os dois partidos encarregados de executar as políticas neoliberais do fim do século XX e começo do século XXI são produtos de movimentos encabeçados pela classe média. O Partido Panamenhista (fundado no fim da década de 1930) governou durante os períodos 1989-1994 e 1999-2004. O Partido Democrático Revolucionário (fundado em 1978) ganhou as eleições de 1994 e esteve no poder até 1999, iniciando um novo período, em 2004, que durará até 2009.
No intervalo de quinze anos, entre 1990 e 2005, os governos em exercício executaram políticas neoliberais de flexibilização, reestruturação e privatização. Para legitimar essas políticas recorreram às propostas transitistas tradicionais, alegando que um projeto nacional é inviável e que o Panamá deve continuar especializado na prestação de serviços em escala internacional, aproveitando a suposta posição geográfica privilegiada do istmo.
A ideia de “fim da história”, resposta ideológica à crise de superprodução em escala mundial, tem seu homólogo no Panamá: a ideologia transitista. Tal ideia remete o sistema capitalista mundial à lógica do mercado como única forma de organização social, tanto antes como depois da crise. Ainda assim, a ideologia transitista propõe que o Panamá, por natureza, tenha seu destino predeterminado: pro mundo beneficio.
O século XX panamenho foi de lutas sociais e enfrentamentos políticos. Para compreender esses conflitos, em seu contexto atual, e fazer projeções para o futuro, é preciso descobrir as contradições – internas e globais – próprias do desenvolvimento dos quatro séculos anteriores. O século XXI teve início com novos confrontos, perseguindo um mesmo objetivo: repor a hegemonia neoliberal como uma nova alternativa de participação democrática e social de todos os setores organizados do país.
A única forma de enfrentar a ideologia neoliberal é com organização e uma alternativa de desenvolvimento que se insira nos processos de globalização. Como diria o historiador inglês Eric Hobsbawn:
embora o processo de globalização seja irreversível e, em alguns aspectos, independente do que façam os governos, bem diferente é a ideologia baseada na globalização, a ideologia do free market , o neoliberalismo; isso que se chamou também de “fundamentalismo do livre mercado”
Dados estatísticos
Indicadores demográficos do Panamá
1950 |
1960 |
1970 |
1980 |
1990 |
2000 |
2010 |
2020* |
|
População |
860 |
1.136 |
1.526 |
1.990 |
2.487 |
3.055 |
3.678 |
4.296 |
• Sexo masculino (%) |
51,28 |
51,03 |
50,87 |
50,66 |
50,54 |
50,57 |
50,52 |
... |
• Sexo feminino (%) |
48,76 |
48,97 |
49,13 |
49,34 |
49,46 |
49,43 |
49,48 |
... |
Densidade demográfica |
11 |
15 |
20 |
26 |
33 |
40 |
49 |
57 |
Taxa bruta de natalidade |
41,41 |
40,87 |
36,15 |
29,50 |
25,45 |
23,12 |
19,6* |
17,2 |
Taxa de crescimento |
2,67 |
2,99 |
2,79 |
2,30 |
2,06 |
1,94 |
1,62* |
1,35 |
Expectativa de vida |
56,80 |
62,12 |
66,730 |
71,00 |
73,56 |
75,56 |
77,5* |
79,5 |
População entre |
42,29 |
43,86 |
44,07 |
40,84 |
35,87 |
32,13 |
29,32 |
25,9 |
População com |
3,57 |
3,62 |
3,76 |
4,16 |
4,73 |
5,53 |
6,77 |
8,6 |
População urbana (%)¹ |
35,76 |
41,25 |
47,64 |
50,45 |
53,90 |
62,20 |
65,12 |
68,13 |
População rural (%)¹ |
64,24 |
58,75 |
52,36 |
49,55 |
46,10 |
37,80 |
34,89 |
31,87 |
Participação na população |
0,51 |
0,52 |
0,53 |
0,55 |
0,56 |
0,58 |
0,62 |
0,65 |
Participação na |
0,034 |
0,038 |
0,041 |
0,045 |
0,047 |
0,050 |
0,053 |
0,056 |
Fontes: ONU. World Population Prospects: The 2012 Revision Database
¹ Dados sobre a população urbana e rural retirados de ONU. World Urbanization Prospects, the 2014 Revision
* Projeção. | ** Estimativas por quinquênios. | *** Inclui o Caribe.
Obs.: Informações sobre fontes primárias e metodologia de apuração (incluindo eventuais mudanças) são encontradas na base de dados indicada.
Indicadores socioeconômicos do Panamá
1960 |
1970 |
1980 |
1990 |
2000 |
2010 |
2020* |
|
PIB (em milhões de US$ a |
… |
… |
… |
9.743,2 |
15.964,8 |
28.814,1 |
... |
• Participação no PIB |
… |
… |
… |
0,368 |
0,446 |
0,579 |
... |
PIB per capita (em US$ a |
… |
… |
… |
3.919,0 |
5.229,2 |
7.839,1 |
... |
Exportações anuais |
… |
… |
2.519,3 |
3.346,2 |
5.838,5 |
… |
... |
• Exportação de produtos |
… |
… |
8,90 |
17,00 |
15,90 |
… |
... |
• Exportação de produtos |
… |
… |
91,10 |
83,00 |
84,10 |
… |
... |
Importações anuais |
… |
… |
2.806,0 |
3.503,9 |
6.981,4 |
… |
... |
Exportações-importações |
… |
… |
-286,7 |
-157,7 |
-1.142,9 |
… |
... |
Investimentos estrangeiros |
… |
… |
218,50 |
135,50 |
603,40 |
… |
... |
Dívida externa pública |
… |
… |
2.211,0 |
5.611,0 |
5.604,0 |
… |
... |
População Economicamente |
... |
... |
650.200 |
920.326 |
1.273.008 |
1.660.278 |
2.073.626 |
• PEA do sexo |
... |
... |
71,89 |
69,04 |
65,89 |
62,77 |
60,10 |
• PEA do sexo |
... |
... |
28,11 |
30,96 |
34,11 |
37,23 |
39,90 |
Taxa anual de |
… |
… |
… |
... |
... |
7,7 |
... |
Matrículas no |
… |
255.287 |
337.522 |
351.021 |
400.408 |
439.746 |
... |
Matrículas no |
… |
78.466 |
171.273 |
195.903 |
234.153 |
283.787 |
... |
Matrículas no |
… |
8.947 |
40.369 |
53.235 |
118.502 |
139.116 |
... |
Professores |
… |
13.215 |
20.499 |
25.003 |
30.591 |
37.247 |
... |
Médicos |
401 |
857 |
1.821 |
2.750 |
3.798 |
5.121 |
... |
Índice de Desenvolvimento |
… |
… |
0,627 |
0,651 |
0,709 |
0,759 |
... |
Fontes: CEPALSTAT
¹ UNESCO Institute for Statistics. Não há dados para o número de professores no ciclo terciário.
² UNDP. Countries Profiles
* Projeção.
Obs.: Informações sobre fontes primárias e metodologia de apuração (incluindo eventuais mudanças) são encontradas na base de dados ou no documento indicados.
Mapas
Bibliografia
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