Mulher, Violência contra a

Em 9 de junho de 1994, durante o vigésimo quarto período ordinário de sessões da Assembleia da Organização dos Estados Americanos (OEA), realizada em Belém, no Brasil, foi aprovada por aclamação a Convenção Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra a Mulher. Redigida pela Comissão Interamericana de Mulheres da OEA, com participação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o documento condenou os atos de violência física, sexual e psicológica e estabeleceu o direito da mulher a ser educada livre de padrões estereotipados de inferioridade ou subordinação.

A Convenção de Belém do Pará, como ficou conhecida, entrou em vigor em 5 de março de 1995, depois de ratificada pela Bolívia e por Barbados. Ao rati­ficar o documento, os países-membros se comprometeram a mudar os padrões de comportamento que dão base aos atos de violência, combatendo-os com programas de educação formal e não formal. Em 2006, 31 dos 34 países-membros da OEA haviam ratificado o documento (as exceções eram Canadá, Estados Unidos e Jamaica).

Naquele momento, entre 12% e 52% das mulheres latino-americanas e do Caribe com mais de 15 anos de idade eram vítimas de algum tipo de violência. Dificultava o combate a essa situação o fato de as sociedades, em geral, só reconhecerem como delitos (portanto atos passíveis de punição) atos violentos públicos, considerando “assunto privado” eventos ocorridos no âmbito do lar. Os agressores domésticos, em geral, ficavam impunes, e as vítimas, desprovidas de atendimento médico e psicológico adequados.

Lea Guido definiu a violência intrafamiliar como qualquer ação ou omissão que resulte em dano à integridade física, sexual, emocional, social ou patrimonial de um ser humano em um meio no qual há vínculo familiar ou íntimo entre a vítima e o(a) agressor(a). A violência, nessa esfera, pode se manifestar na forma de abuso direto, descuido, ameaça, privação arbitrária de liberdade, controle de comportamento ou coação. Expressa-se, em geral, em atos do homem, dotado da “autorização cultural” para agredir fisicamente, ofender, degradar a autoestima, faltar ao respeito, limitar o direito ao trabalho e ao convívio com familiares e amigos, e restringir o apoio econômico e afetivo à mulher. A violência psicológica, nesse contexto, é a de mais difícil diagnóstico, já que a vítima a incorpora como fato cotidiano.

Um estudo realizado em sete países da América Central (Belize, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e Panamá) não identificou, em 2006, nenhuma previsão legal contra a violência doméstica. Só na Nicarágua havia referência às definições da Convenção de Belém do Pará. Nos demais, sequer havia normas para obtenção de informações sobre o tema.

O relatório Saúde nas Américas de 2002, da Organização Pan-Americana da Saúde, indicava que, em 1998, 21% das mulheres de 15 a 49 anos da Nicarágua haviam sido vítimas, alguma vez, de uma agressão grave por parte do companheiro. Na Colômbia, em 1995, uma em cada cinco mulheres se declarava vítima de alguma agressão por parte dos parceiros. Em Santiago do Chile e na região metropolitana de Lima, no Peru, registrava-se que em 1997, 23% e 31% das mulheres de 15 a 49 anos, respectivamente, tinham sido agredidas por seus companheiros nos doze meses anteriores à pesquisa. Os números indicam uma verdadeira “epidemia submersa”, que requer políticas sustentadas na Convenção de Belém do Pará.

A presidenta Dilma Rousseff sancionou a lei 13.104, em março de 2015, que considera como homicídio qualificado o chamado feminicídio, quando uma mulher é morta simplesmente pelo fato de ser do sexo feminino. A pena para homicídio qualificado varia de 12 a 30 anos de reclusão. A norma também incluiu o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Além disso, a lei estabeleceu o acréscimo de 1/3 da pena se o crime for cometido durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; se a vítima for menor de 14 anos, maior de 60 ou com deficiência; e se for praticado na presença de descendente ou ascendente da vítima.