Roberto Carlos

Roberto Carlos

Cachoeiro do Itapemirim (Brasil), 1941

Cantor e compositor de maior sucesso comercial da história do Brasil, Roberto Carlos Braga, conhecido como “O rei”, tem uma carreira marcada pelo romantismo de suas canções e por sua ligação com o fortalecimento da indústria cultural de massas. O primeiro grande ídolo do rock brasileiro encarnou as contradições entre as mudanças comportamentais e de consumo dos anos 60 e um forte conservadorismo político e religioso.

Filho de pai relojoeiro e mãe lavadeira, aos seis anos de idade sofreu um acidente de trem, no qual perdeu uma das pernas, passando a usar uma prótese. Em 1955, mudou-se para Niterói e depois para Lins de Vasconcelos, bairro do subúrbio do Rio de Janeiro. Estreou na TV em 1957, na Tupi carioca, cantando o rock “Tutti-frutti”.­ Um ano depois, conheceu a “turma da Matoso”, rua do bairro da Tijuca onde faria amizade com o seu parceiro de composições Erasmo Carlos e também com Tim Maia, com os quais formou o efêmero conjunto The Sputniks. Em 1959, gravou seu primeiro compacto, que passou despercebido, assim como seu primeiro LP, Louco por você (1961), hoje renegado pelo cantor. Aconselhado pela gravadora, passou a se dedicar a canções voltadas para os jovens. Algumas eram composições próprias, mas seus primeiros sucessos eram principalmente versões de músicas norte-americanas feitas com Erasmo, como “Splish-splash” (1963) e “Calhambeque”, do disco É proibido fumar (1964). No ano seguinte começou a ser assessorado por uma empresa de publicidade, a Magaldi-Maia Et Prosperi.

Em 1965, estreou na TV Record, para todo o país, o programa Jovem Guarda. Encabeçado por Roberto Carlos, gerou uma espécie de versão brasileira da ­ beatlemania. Além da música, o programa divulgou moda, gírias e um comportamento associado ao rock. No mesmo ano saiu o disco com o nome do programa. Uma das canções, “Quero que vá tudo pro inferno”, um dos maiores sucessos da sua carreira, mais tarde foi proscrita do seu repertório devido a sua aproximação com o catolicismo.

Para as demais correntes da Música Popular Brasileira (MPB), reunidas principalmente em torno do programa O Fino da Bossa, apresentado por Jair Rodrigues e Elis Regina, e para a juventude de esquerda das universidades, mais próxima do samba e da canção de protesto de Geraldo Vandré, o programa e o movimento da Jovem Guarda eram americanizados e seus fãs e artistas alienados da grave situação política da época.

Entre 1966 e 1967, o conflito na música se acirrou, ao mesmo tempo em que Roberto Carlos vivia um de seus momentos mais criativos como compositor. Lançou Roberto Carlos (1966) e o disco de seu primeiro filme, dirigido por Roberto Farias, Roberto Carlos em ritmo de aventura (1967), que consolidou seu nome como “marca” associada a roupas e até a postos de gasolina. Um dos pontos altos do embate com a MPB tradicionalista foi a passeata contra a guitarra elétrica, liderada por Elis Regina, em 1967. Entretanto, no mesmo ano, Roberto Carlos participou do histórico III Festival da Música Popular da Record, com o samba “Maria, carnaval e cinzas”, de Luiz Carlos Paraná. Ficou em quinto lugar. Nesse festival surgiu a Tropicália, movimento liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil. Absorvendo influências do rock e da MPB em uma mistura psicodélica e vanguardista, o tropicalismo levaria a uma revisão de muitos setores da música brasileira sobre a Jovem Guarda, particularmente sobre a qualidade e importância das composições de Roberto Carlos.

Sinatra brasileiro

Em 19 de janeiro de 1968, Roberto Carlos despediu-se do programa Jovem Guarda e distanciou-se do chamado “iê-iê-iê”. No mesmo ano, composições suas foram gravadas por nomes da MPB como Gal Costa e Elis Regina. Além disso, venceu o Festival de San Remo, na Itália, com “Canzone per te”, de Sergio Endrigo e Sergio Bardotti. Foi o começo da transição de ídolo do rock para cantor romântico, uma espécie de “Frank Sinatra brasileiro”.

Nesse período intermediário, com forte influência da música negra norte-americana, lançou As curvas da estrada de Santos (1969), disco que, além da bela faixa-título, trouxe o sucesso “Sua estupidez”. Também estrelou seu segundo filme, Roberto Carlos e o diamante cor-de-rosa. No ano seguinte, estreou o espetáculo que consolidou sua imagem como cantor romântico, dirigido por Miele e Ronaldo Bôscoli, e viveu a controvérsia do êxito da canção religiosa “Jesus Cristo”. Nessa nova fase, começou a obter sucesso na Europa e principalmente na América Latina, lançando álbuns com versões de suas músicas em espanhol. Apesar da qualidade e da forte empatia emocional de muitas das suas composições, voltou a se afastar da maior parte do meio musical da MPB, não mais sob o rótulo de roqueiro americanizado, mas sim de cantor brega, com arranjos orquestrados grandiosos feitos pelo maestro norte-americano Jimmy Wisner para o álbum Roberto Carlos (1971).

Em 1974, estreou seu primeiro especial de Natal para a Rede Globo, o que se tornaria uma tradição anual – programa de TV com disco no fim do ano – e resultaria em um contrato de exclusividade com a maior TV do país, fortemente ligada ao regime militar. Ao longo de toda a sua carreira, Roberto Carlos manteve uma posição pública apolítica, não fazendo declarações nem tomando posicionamentos em meio à polarização e forte repressão da ditadura militar.

Roberto Carlos lançou um disco por ano, e seu álbum de 1976, também batizado apenas com seu nome, foi o primeiro do Brasil a atingir um milhão de cópias vendidas. Ao mesmo tempo, consolidou sua carreira em toda a América Latina. Em 1977, bateu novo e impressionante recorde de 2,2 milhões de cópias vendidas no mercado brasileiro. No final dos anos 70, lançou um disco de sucesso atrás do outro. No começo dos anos 80, estreou em inglês Sail Away (1980) e também produziu um álbum em francês, não alcançando o mesmo êxito que os gravados em espanhol, idioma no qual, em 1986, atingiria o segundo lugar na parada latina norte-americana.

Embora mantivesse uma forte vendagem, seu espaço na música foi se reduzindo nos anos 80 e 90, devido à combinação de um número cada vez menor de canções inspiradas, em discos com temas e arranjos orquestrados cada vez mais burocráticos. Roberto Carlos nesse período fixou-se cada vez mais em um nicho próprio de mercado, com músicas dedicadas a taxistas, mulheres de óculos, caminhoneiros etc. Por mais que esse nicho fosse imenso (seu álbum de 1994 vendeu mais de 1,9 milhão de cópias), era isolado tanto da MPB quanto do centro das modas musicais, espaço ocupado por uma nova geração de rock brasileiro, em meados dos anos 80, pelo sertanejo, no fim da mesma década, e pela chamada axé music , nos anos 90. Também foi um perío­do marcado pela crescente veia religiosa e pelas superstições e excentricidades do cantor, mais tarde diagnosticadas como transtorno obsessivo-compulsivo.

Redescoberta

Entretanto, foi nessa época que começou uma retomada do interesse da MPB pela obra do cantor. Houve a iniciativa dos irmãos Caetano Veloso e Maria Bethânia (que, em 1993, gravou um disco só com composições de Roberto e Erasmo, As canções que você fez para mim ), e descoberta, aqui e ali, de composições dos anos 60 e 70 pelas novas gerações, como no disco coletivo Rei (1994), no qual bandas jovens como Skank, Chico Science & Nação Zumbi e Barão Vermelho gravaram músicas suas.

Em dezembro de 1999, sua esposa, Maria Rita de Cássia Simões Braga, faleceu de câncer, após dois anos lutando contra a doença. Foi o primeiro ano, desde 1963, em que Roberto Carlos não lançou um disco inédito. Dois anos depois, surgiu Acústico MTV , projeto feito em parceria com a emissora voltada para o público adolescente, retomando em novas versões sucessos de várias fases da sua carreira. A exibição do programa foi vetada pela TV Globo, mas o lançamento do CD e do DVD ajudaram a renovar sua música e sua imagem, sendo o álbum mais vendido de Roberto Carlos em duas décadas. Em 2004, sua gravadora iniciou o lançamento de caixas de CDs com todos os seus álbuns em português, com exceção do primeiro e renegado Louco por você.

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