O conceito de campesinato está entre os mais difíceis de se explicar. Diferentemente das categorias de trabalhador assalariado ou de empresário capitalista, que sempre se produzem e se reproduzem exclusivamente a partir da relação trabalho-capital, em todos os lugares o campesinato se cria e se recria por meio da relação familiar e do assalariamento temporário. O campesinato só pode ser compreendido em um processo multidimensional, ou seja, na interação de todas as dimensões do desenvolvimento humano: política, econômica, social, natural e cultural. O trabalho na terra e a produção de alimentos são relações principais que identificam os diferentes tipos de campesinato em qualquer parte do mundo.
Embora hajam similaridades, o campesinato tem suas características distintas na maioria das regiões do mundo. A diversidade cultural e econômica é uma das principais riquezas do campesinato. Os camponeses indígenas de Chiapas (México) e os gaúchos do Rio Grande do Sul (Brasil) possuem entre si semelhanças e diferenças, e a mesma coisa ocorre em relação aos camponeses indígenas mapuche (Chile e Argentina) e os da região Nordeste do Brasil. Da mesma forma, apesar de viverem relações análogas, os camponeses sem terra brasileiros, bolivianos e paraguaios possuem muitas distinções.
Essas diferenças e semelhanças estão representadas nos diversos conceitos adotados para se referir ao campesinato: pequeno agricultor, lavrador, agricultor familiar, campesinato indígena, pequeno produtor, agricultor familiar camponês, produtor familiar etc. Essas diferenças refletem as múltiplas relações sociais em que os camponeses estão envolvidos. Na dimensão econômica, há situações em que distintas relações ocorrem ao mesmo tempo. Um exemplo é o camponês desenvolver o trabalho familiar em sua terra e trabalhar como assalariado para completar sua renda. São os casos de camponeses mexicanos ou guatemaltecos que trabalham nos Estados Unidos, ou de camponeses nordestinos no Estado de São Paulo. Outro exemplo é o camponês precisar contratar trabalho assalariado em períodos como o de safra, em que a mão de obra da família se torna insuficiente. Ou ainda o camponês trabalhar como assalariado em um período e contratar assalariados em outro. Em alguns casos, o campesinato é pluriativo, trabalha nas cidades ou no campo, em atividades não agrícolas.
Existem também diferenças e semelhanças na cultura, nas relações com a terra e com o terrítório de camponeses indígenas e não indígenas, que recebem influências de diferentes religiões e da mídia. É significativo que haja também uma influência mútua entre elas: um exemplo foi a influência da música mexicana e paraguaia na música caipira brasileira, um dos tipos de música camponesa do Brasil. Para camponeses indígenas ou não, as festas, músicas e danças possuem significados constituídos por diferentes motivos, mas predominam em sua origem as relações com o trabalho e a natureza. A propriedade da terra tem vários sentidos: particular, comum e comunitário.
Dentre as características comuns dos camponeses, destacam-se: a organização do trabalho e da produção familiar e/ou comunitária; as formas de uso da terra para produzir alimentos; a organização de cooperativas para os vários tipos de trabalho; a produção em pequena escala e a criação de tecnologias apropriadas na relação com o espaço natural; a policultura, a participação intensiva nos mercados locais e a produção para o autoconsumo; a subordinação aos processos produtivos determinados pela agroindústria e as expressivas participações na produção para exportação.
O campesinato está entre os tipos de organização social mais antigos da história da humanidade. Participou tanto da construção de sociedades quanto das transformações políticas das sociedades modernas. A luta pela terra e pelo território são outras relações de semelhança entre os diferentes tipos de campesinato. A expropriação pelas desigualdades produzidas no desenvolvimento capitalista e a ressocialização gerada na luta camponesa pela terra são situações que expressam a complexidade das semelhanças e diferenças do campesinato.