Capitão do Exército brasileiro que se tornou famoso em janeiro de 1969, ao desertar do 4º Regimento de Infantaria com 63 fuzis automáticos, metralhadoras e munição, Carlos Lamarca foi um dos comandantes do grupo guerrilheiro urbano Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Suas façanhas inspiraram lendas, filmes e livros. Filho de um sapateiro, estudou no Colégio Militar e na Academia Militar de Agulhas Negras, onde se destacou pela disciplina e pela exímia pontaria. Pouco antes de abandonar o Exército, fora indicado para treinar caixas de um banco a enfrentar as ações armadas da esquerda, atividade noticiada pelas principais revistas do país, o que chamou mais atenção ainda para sua adesão à guerrilha. Foi um dos líderes de esquerda mais intensamente caçados pela repressão, com fotografias nos cartazes de procurados.
Em 1966, ainda como tenente, atuando como oficial de dia, permitiu a fuga da prisão do coronel nacionalista Jefferson Cardim. Essa suspeita rendeu-lhe o primeiro inquérito policial-militar. Juntamente com a VPR, defendia que a revolução deveria ter desde o início um caráter socialista, repudiando a política de libertação nacional defendida por Carlos Marighella. Foi um dos promotores da fusão da VPR com o Colina (Comando de Libertação Nacional), que resultou na Vanguarda Armada Revolucionária-Palmares (VAR-Palmares). Os movimentos de que participou se especializaram nas invasões a quartéis e em ações espetaculares, como a tomada do cofre do ex-governador Adhemar de Barros, onde havia 2,4 milhões de dólares, e nos sequestros de diplomatas estrangeiros, para a libertação de prisioneiros políticos.
Em setembro de 1969, Lamarca liderou uma dissidência dentro da VAR-Palmares que adotou o antigo nome VPR. Na nova organização, uma das figuras de destaque seria Ladislau Dowbor que, com o codinome Jamil, procurava combinar as teorias econômicas de Andre Gunder Frank com as teses anti-imperialistas de Frantz Fanon, criando a política da propaganda armada. Em meados de 1970, a escola de guerrilheiros que Lamarca dirigia na região do Vale do Ribeira, próximo do litoral sul de São Paulo, foi descoberta pela repressão, e ele comandou uma fuga espetacular e particularmente humilhante para o Exército, impondo pesadas baixas ao inimigo e empreendendo uma desconcertante manobra para despistá-lo.
Era casado com Marina Lamarca, que se exilou em Cuba com os dois filhos antes que o marido abandonasse o Exército. Na guerrilha, conheceu Iara Iavelberg, com quem viveu intenso romance. Em discordância também com a nova VPR, ambos filiaram-se ao Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e, em meados de 1971, transferiram-se para o Estado da Bahia. Iara foi localizada pela repressão em Salvador e morta numa emboscada. Lamarca e um companheiro, o operário metalúrgico José Campos Barreto, um dos líderes da greve de Osasco de 1968, foram identificados em Buriti Cristalino e sofreram épica perseguição no sertão da Bahia, sendo finalmente localizados, exauridos, sob uma árvore, no município de Pintada, no dia 17 de setembro. Foram metralhados enquanto dormiam. Depois da anistia política, assinada em 1979, Lamarca foi promovido a general de brigada, mesmo posto ao qual também foi promovido outro legendário ex-capitão – o ex-secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Luiz Carlos Prestes.