Gaitán, Jorge Eliécer

Bogotá (Colômbia), 1898 - 1948

Estudante de direito na década de 1920, Gaitán esteve sujeito às limitações bibliográficas e de informação da época em que iniciou seus estudos sobre as relações sociais capitalistas e seus efeitos na agricultura e nos nascentes centros urbanos. Recorria às fontes clássicas da economia política e ao que se podia conhecer da obra de Marx, com resultados que, sem dúvida, denotam muitas deficiências e impropriedades.

Esse é o Gaitán que se pode encontrar no ensaio juvenil “As ideias socialistas na Colômbia”, no qual o autor reconhece o papel central da propriedade da terra como fundamento da renda agrária. Embora sem um alto nível de elaboração, tal concepção diferia das tendências defendidas em seu tempo por personagens como Lleras Rastrepo, que propunha a via reformista para a transformação da agricultura, ou López Pumarejo que, sob a aparência de atacar os proprietários, na realidade pugnava por transformá-los em rentistas ou parasitas do capital, para permitir a alavancagem da empresa agrária de corte moderno.

Diferentemente da maioria dos dirigentes da sua geração, Gaitán queria interrogar a sociedade colombiana a respeito do seu caráter capitalista e também obter um entendimento sistêmico. Isso o levou a contemplar a alternativa de conservação do capital, entendendo este como um simples fator de produção, com a pretensão de colocá-lo a serviço de relações mais justas. Era por esse motivo que no pensamento gaitanista estava ausente qualquer referência à existência de classes e frações de classes, e tudo se reduzia à oposição entre oligarquia e povo. Apesar disso, ao analisar o que chamava o país político, ele admitia que nesse cenário os partidos políticos veiculariam uma divisão entre os associados muito diferente da real, em benefício de uma ordem para cuja manutenção contribuíam.

Na década de 1940, Gaitán liderou um movimento, respaldado por grande mobilização social, que reivindicava a distribuição econômica e a participação política. Depois das eleições de 1946, o partido conservador ascendeu à presidência com Mariano Ospina Pérez, devido à divisão liberal (das frações dirigidas respectivamente por Gabriel Turbay e Jorge Eliécer Gaitán). Abriu-se, então, com força a possibilidade eleitoral de Gaitán para o período seguinte (1950-1954), com uma renovada organização política, a União Nacional da Esquerda Revolucionária (UNIR), acusada pelo governo conservador de ponta de lança do comunismo e representante das forças destruidoras da livre empresa privada e dos valores cristãos ocidentais.

No cenário de uma cidade enfeitada para as sessões da IX Conferência Pan-americana, aconteceu o assassinato de Gaitán, em pleno centro de Bogotá, em 9 de abril de 1948. O assassino, Roa Sierra, foi linchado pela multidão ensandecida, fazendo aparecer o rosto do protesto social, o levante contra a fome e a exclusão. Foi impossível conter os saques a armazéns e lojas. A ira também se voltou contra os símbolos do regime, cujos edifícios foram incendiados. A polícia se sublevou e aderiu ao movimento. Organizou-se uma junta revolucionária, controlaram-se as emissoras de rádio, que passaram a conclamar a formação de juntas similares em todo o país e a requisição de armas. Foi assim que o Bogotaço teve expressão nas duas semanas seguintes em numerosos povoados e bairros, que viram momentaneamente alterada a ordem institucional. Falava-se de um novo regime revolucionário e, com efeito, constituíram-se governos populares, respaldados por milícias de diversas composições sociais.

Contudo, nunca chegou a existir um verdadeiro poder paralelo, dada a desorganização e a desconexão. Além disso, a junta revolucionária de Bogotá, tímida e sem vocação para o poder, delegou aos notáveis do Partido Liberal (PL) (encabeçado por Carlos Lleras Restrepo) o relacionamento com o governo. O acordo oligárquico veio rápido. Constituiu-se um governo de união nacional, com a participação de Dario Echandia (liberal) como ministro do governo. Em face dessa verdadeira capitulação, a rebelião de Bogotá dissolveu-se, embora a resistência na província tenha se prolongado por alguns dias mais.

Daí em diante, o chamado fantasma do 9 de abril, isto é, a ameaça de que voltaria a ocorrer uma insurreição, alimentou com força a fogueira da violência bipartidarista nos campos e cidades. O PL passou à resistência civil, e subiu à cena o governo de Laureano Gómez, em 1950. Seu mandato foi interrompido em 1953 pela ditadura de Rojas Pinilla, ante o quadro de transbordamento incontível da violência, que opunha definitivamente, em verdadeira guerra, os agentes militares do governo conservador e bandos privados, apoiados ou tolerados por ele, às guerrilhas liberais que, como mecanismo de autodefesa, formaram-se em resposta à insuficiência da resistência civil do partido liberal.